O Fio Mágico
conto francês
Era uma vez num
vilarejo um menino chamado Pierre. Tinha perdido o pai e, como homem da casa,
ajudava muito sua mãe: limpava a casa, fazia compras, cuidava do jardim,
cortava lenha. Pierre não gostava da escola. Preferia sonhar acordado. As aulas
de história, particularmente, eram um tédio porque ele pensava muito mais no
futuro do que no passado e gostava de imaginar o que faria mais tarde, quando
seria adulto.
“Como é difícil
esperar”, pensava Pierre. Patinando no lago gelado ele lamentava: “Poderia
tanto ser verão !” E quando chegava o verão, ele ansiava pelo outono para poder
soltar sua pipa. No outono só lembrava da beleza da primavera quando se abriam
as flores e nasciam as folhas nos galhos. Mas assim que a primavera chegava,
ele já imaginava as manhãs frias do inverno, suas noites misteriosas e geladas.
Quando sentava no banco da escola de manhã ele desejava que fosse de tarde. E
no domingo de noite, deitado na sua cama, suspirava: “Ah ! se as férias
pudessem começar já !”
Pierre, que adorava
inventar brincadeiras, tinha muitos amigos. Mas sua grande paixão morava na
casa ao lado e se chamava Lisa. Ela corria tão rápido quanto um menino e nunca
ficava brava com ele, mesmo quando ele ficava impaciente com ela. Muitas vezes,
quando ela vinha buscá-lo, ele pensava: “Ah ! queria ser gente grande para
casar com a Lisa...”
Num dia ensolarado de
férias, Pierre foi passear na floresta. Deitou numa clareira e adormeceu ao
calor do sol. Uma voz chamando seu nome o despertou. Viu uma velha senhora que
não conhecia – e Pierre conhecia todos os habitantes do vilarejo. Ela era
estranha, vestia roupas esquisitas, mas sorriu para ele e disse gentilmente:
– É verdade que o
momento presente nunca é o momento certo para você ? Pois fique contente: tenho
aqui algo que pode ajudar, se você quiser. Olhe ! – Na mão dela estava uma
pequena bola prateada com um buraquinho do qual saía a ponta de um delicado fio
de ouro.
– Vou contar um
segredo: esta bola é mágica ! Está vendo este fio ? É o fio do tempo. É só
puxar que o tempo passa rapidinho. Você quer?
Pierre ficou encantado.
Será verdade ? Tédio, medo, tristeza, tudo poderia ser apagado num instante com
a pequena bola ?!
– Oh sim ! Me dá ! Eu
quero a bola mágica, por favor !
– Tudo bem. Mas antes
vou lhe dar um conselho: lembre-se que
nunca poderá reaver o tempo passado. Desaparecerá como fumaça. É melhor não
puxar o fio com muita freqüência nem com muita força. Se quiser que o tempo
passe devagar, como passa para todo mundo, apenas não toque no fio. E não pode
contar da bola para ninguém senão, naquele dia, você morrerá.
E Pierre pegou a bola
prateada. Quando olhou, a velha tinha desaparecido. Ele teve vontade de puxar o
fio só um pouquinho, só para ver, mas ficou com medo e não quis se arriscar.
Mas, no dia seguinte,
quando o professor brigou com ele porque não estava prestando atenção durante a
aula, Pierre não resistiu e puxou o fio com muito cuidado. Na mesma hora a aula
acabou. Encantado com o resultado ele caiu na tentação de puxar o fio sempre
mais. Começou para ele uma vida ótima, feita de feriados e férias. Infelizmente
ele aprendia muito pouco, porque mal frequentava a escola, mas ele não estava
nem aí. “Se fosse gente grande poderia trabalhar, casar com Lisa e não
precisaria puxar o fio tanto.” Assim ele resolveu deixar a infância e puxou um
grande pedaço de fio.
Na manhã seguinte ele
já era aprendiz de carpinteiro. A vida ficou maravilhosa. Ele gostava de seu
trabalho. Quando o dia do pagamento
demorava a chegar ele puxava o fio até receber seu salário. Terminado seu
aprendizagem ele ganhava bastante para pedir Lisa em casamento. Ela aceitou com
muita alegria e marcaram o casamento para daqui a algumas semanas. Alguns dias
antes do casamento ele recebeu uma convocação. Chamavam-no para servir durante
dois anos no exército.
Pierre gostou do
exército: fez amigos e, lembrando das recomendações da velha, tentou não puxar
o fio. Mas logo a vida de soldado ficou chata. Cada dia ele puxava o fio mais
um pouquinho, até poder voltar para casa.
Começou então o fase
mais feliz, mais perfeita da sua vida. O casamento foi um dia alegre para todos
e Pierre mal podia esperar a hora de levar Lisa até a casinha que ele tinha
construído com as próprias mãos. Durante o banquete ele notou que os cabelos de
sua mãe já estavam brancos. “Puxei demais o fio !” pensou arrependido e decidiu
tocar nele o menos possível.
Semanas tranquilas
passaram. Lisa ficou grávida. Impaciente, Pierre puxou o fio para apressar o
nascimento de seu filho. Mas Pierre não podia suportar vê-lo doente ou chateado
e puxava o fio toda hora. Começou a ter problemas de trabalho, faltava dinheiro
em casa. Ele pensou: “minha bola mágica é útil exatamente para este tipo de
situação. Preciso aproveitar.” Quando os dias calmos voltaram, Pierre parou de
puxar o fio.
Um dia ele notou com
surpresa que o fio não era mais dourado, mas prateado. E se deu conta de que o
fio não duraria para sempre. Estava feliz com a Lisa. Outros filhos nasceram,
trazendo mais alegria, mas exigindo cuidados, roupas, comida. Uma noite, Pierre
começou a pensar: “Se nossos filhos fossem crescidos, com uma profissão séria,
a vida seria mais agradável.” E ele puxou o fio até todos eles terem ficado
independentes e saído de casa. Todas estas experiências não tinham ensinado
Pierre a ser paciente. Qualquer aborrecimento era motivo para puxar o fio. A
vida passou sempre mais rápida, mas nunca voltou a ser perfeita. O trabalho
começou a cansar Pierre demais. Ele já não conseguia subir nos andaimes,
demorava mais para entregar as encomendas. Chamou seu filho mais velho, a quem
tinha ensinado o trabalho de marceneiro, e lhe disse que estava se aposentando.
Já era avô e achava graça quando o neto mais novo lhe dizia:
– Quero ser grande e ir
para a escola com meus irmãos. – Ou: – Se fosse gente grande, eu poderia
construir casas como você !
Nas noites de verão,
Pierre sentava na varanda da sua casa e fumava o cachimbo olhando para os
campos. Já não sonhava mais com o futuro porque sabia que sua vida estava
acabando e tinha medo. Como todos os velhos, tentava buscar refúgio no passado.
Mas, pobre Pierre, ele não tinha muitas lembranças. Sua vida tinha passado tão
depressa, os prazeres tinham sido tantos, um tão logo atrás do outro, que era
difícil lembrar direito. Ele não podia dizer, como os outros idosos: “Posso me
orgulhar de ter superado este momento difícil.” Ou: “Não lamento meus
sofrimentos porque me ensinaram muito.”
E, um dia, notou
apavorado que o fio tinha ficado cinza. Olhou para sua mulher e a viu cansada e
curvada. No espelho viu um rosto cheio de rugas, seus poucos cabelos eram
brancos. Sentiu necessidade de passear na floresta, respirar o ar puro.
Caminhou até uma clareira onde sentou e adormeceu. De repente, ouviu uma voz
chamando seu nome. Esfregou os olhos e viu a mesma velha, nem mais idosa, nem
mais nova.
– Então, Pierre ? Como
vai ? Me conta: sua vida foi feliz ?
– Na verdade –, disse
Pierre, – não sei. Sua bola mágica é maravilhosa. Nunca tive de esperar ou
sofrer na minha vida, mas passou tudo tão rápido que mal percebi. Era tão
impaciente... queria que tudo fosse sempre melhor e agora estou aqui, velho e
fraco. Não puxo mais o fio para poder viver em paz os últimos anos de minha
vida. Imagino que não posso me queixar, mas seu presente não me trouxe a
felicidade com a qual sonhava.
– Como é possível ? –
disse a velha, – você não é muito agradecido. Diga-me, já que você é tão
esperto, no meu lugar você teria feito melhor ?
– Você deveria ter me
dado um outro tipo de bola –, sugeriu Pierre, – na qual se pode colocar o fio
de volta. Assim poderia ter aprendido com meus erros e a vida não teria passado
tão depressa.
– Infelizmente isto é
impossível. Deus não permite. Mas vou realizar um desejo seu, homem mimado.
Pense no que você mais quer no mundo.
Pierre pensou
profundamente: – Desejaria recomeçar minha vida, mas sem sua bola mágica desta
vez. Quero viver como os outros homens.
Se tiver alegria, que bom. Se sofrer, que assim seja.
A velha sorriu : – Seu
desejo será realizado. Se é isto que você realmente quer, devolva-me a bola
mágica.
Assim que Pierre o fez,
caiu num sono profundo. Quando acordou, ficou muito surpreso em ver que estava
de volta na casa da sua infância, no seu quarto de menino. Sua mãe, sentada na
beira da cama, era jovem de novo. Sorriu para ele e disse:
– Finalmente acordou !
– Onde estou ? –
perguntou Pierre espantado.
– Na sua cama, claro,
menino levado. Você ficou tanto tempo no sol que pegou uma insolação e teve
muita febre. Teve pesadelos terríveis. Ficava falando de uma bola mágica e de
um fio de ouro. Não entendia nada. Que bom que você está fora de perigo agora.
Pierre abraçou a mãe. –
Então Lisa e eu não somos velhos ?
– Você está delirando
de novo –, disse a mãe preocupada. – Lisa está ali na sala, esperando para ver
você.
E chamou: – Lisa ! Vem
ver o Pierre !
A menina entrou,
enxugando escondido uma lágrima.
– Lisa ! – gritou
Pierre, – sarei ! Amanhã irei para a escola e um dia nós dois vamos casar. Mas
agora vamos brincar !
Quando pulou da cama, notou que um pedacinho de
fio de ouro tinha ficado preso na sua roupa.
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