Urashima e a Tartaruga
conto japonês
Muitos
anos atrás, no Japão, vivia um jovem pescador a beira do mar, onde as grandes
ondas verdes quebravam na praia como nuvens de água salgada. Esse moço,
Urashima Taro, amava a água como se fosse sua irmã, e passava muitos dias em
seu bote, desde o púrpura da madrugada até o lilás do anoitecer.
Um
dia, passando pela praia, ele se aproximou, curioso, de crianças agrupadas ao
redor de alguma coisa, descobriu que elas estavam maltratando uma tartaruga e,
ao ver aquela maldade, gritou:
- Ei
amigos, não façam isto com esta tartaruga! Ela é parte da natureza e é
importante para todos, deixem-na seguir o seu caminho!
O
grupo logo se dispersou e Urashima pôde levar a tartaruga ferida para sua casa
e cuidar dela. Quando a tartaruga ficou boa, o jovem devolveu-lhe a liberdade
nas águas do mar e, imediatamente, a tartaruga nadou para as profundezas e
desapareceu nas ondas.
Tempos
depois, quando Urashima Taro estava pescando em alto mar, uma tartaruga se
aproximou de seu barco e falou:
-
Obrigado por me salvar das crianças que me feriram e, como agradecimento, lhe
faço um convite de vir comigo conhecer o mundo encantado do fundo do mar. Venha
encontrar meu povo, que vive milhas e milhas abaixo das ondas verdes, no
Palácio do Dragão do Mar. Venha amigo e levarei você até lá em minhas costas.
Urashima
aceitou e lá se foram na direção das profundezas, a tartaruga levando Urashima
sobre o seu caso. Antes do anoitecer eles já haviam chegado ao Palácio do
Dragão do Mar, todo feito de conchas e corais, pérolas e esmeraldas. Lá o
rugido das ondas da superfície se transformara em um murmúrio trêmulo que fazia
o silêncio mais doce e a luz do sol chegava como um crepúsculo. Peixes com
nadadeiras de prata estavam esperando por eles.
Uma
bela moça veio recebê-los, a Princesa Otohime, filha do dono do Palácio que, ao
agradecer Urashima por sua bondade com a tartaruga, disse:
-
Você é bem vindo e poderá ficar aqui por quanto tempo desejar.
Houve
uma grande festa e danças, e a Princesa cantou para homenagear o visitante
enquanto eram servidas comidas raras e deliciosas que o oceano guarda para seus
filhos.
Urashima
viveu um sonho de felicidade com a Princesa do Palácio do Dragão do Mar. Os
dias se transformaram em semanas, as semanas em meses e Urashima se sentia tão
bem no Palácio do Dragão do Mar que se esqueceu até do tempo que estava lá. Até
que um dia, depois de haver passado quatro anos, ele lembrou de sua terra,
desejou rever seus pais e a sua família. Ele lembrava com saudade das ruas da
vila e da faixa de areia lambida pelas ondas onde costumava brincar em sua
infância. Urashima não precisou falar de seu desejo à princesa pois ela já
sabia de tudo, e Otohime lhe disse com tristeza:
-
Tenho medo de deixá-lo ir, mas vejo que tem muita saudade de casa e de sua
família. Não vou prendê-lo mas sei que você vai querer retornar ao fundo do
mar. Leve então este presente, esta caixinha mágica que não deixará que nada
lhe aconteça. Quando olhar para ela, lembre-se de como foi feliz aqui, mas não
abra esta caixa porque, se ele for aberta, você nunca mais poderá voltar aqui
para o fundo do mar.
E a
Princesa lhe entregou uma caixinha de madrepérola decorada com um lindo laço de
pérolas e corais. Com a caixa em mãos, Urashima Taro retornou para a praia tão
conhecida de sua vila, viajando nas costas de sua amiga a tartaruga.
Ele
sabia que logo depois, na baía, ficava a casa de seu pai, junto a um grande
pinheiro. Mas quando foi chegando perto, não viu a casa, nem o pinheiro. Olhou
ao redor e as outras casas também lhe pareceram estranhas e ele viu pessoas
desconhecidas que andavam pelas ruas. Ele ficou espantado com tamanha mudança
em tão pouco tempo e, quando um homem velho veio caminhando pela praia,
Urashima lhe perguntou:
- Por
favor, o senhor poderia me dizer onde fica a casa de Urashima?
-
Urashima? - disse o velho, - Urashima! Contam que ele se afogou quando pescava
e seus pais e irmãos já viveram e morreram faz anos. Isto aconteceu
quatrocentos anos atrás, contam que num dia de verão como este.
Haviam
passado quatrocentos anos e não quatro como Urashima pensava! E tudo que
conhecia havia desaparecido! Seu pai, sua mãe, seus irmãos e seus companheiros
de brincadeiras, a casa, a vila, tudo o que ele tanto amava. Sentiu-se
solitário, perdido. Percebeu que precisava correr de volta ao Palácio dos
Dragões que era agora seu único lar. Mas como retornar? Ele andou pela praia
sem conseguir se lembrar do caminho de volta.
Finalmente,
triste e desiludido, perturbado e confuso, esquecendo a promessa que fizera à
princesa, ajoelhou-se na areia, pegou a caixinha de madrepérola e abriu-a. Elevou-se
uma nuvem de fumaça branca e, enquanto ela se dissipava no ar, Urashima pensou
ver o rosto da Princesa do Dragão. Em vão a chamou, tentou alcançá-la... a
nuvem já flutuava sobre as ondas distantes, na direção do horizonte.
De
repente ele sentiu um imenso cansaço. Suas mãos pareciam tremer, seu corpo se
encurvou, sua pele se enrugou, seu cabelo se tornou branco. Em poucos
instantes, Urashima envelheceu, sentindo-se como que unido ao passado em que
fora feliz.
Quando
a lua pendurou seu crescente de luz na abóboda do céu, só restavam na areia da
praia uma caixinha de madrepérola e as grandes ondas verdes que abriam seus
braços de espuma branca.
E haviam passado quatro centos anos.
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